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Mensagem por Mag Ter 27 Nov 2012 - 1:10

Olá, pessoal. Esta é a minha galeria. Leiam e comentem meus contos. Espero que gostem de verdade.

. Índice de Contos .

.  Uma Humana (neste post)
.  Reações
.  A vida como ela é
.  Ab imo corde
.  Assalto
.  Reprodução de um diálogo
.  Um conto a concluir?
.  Sorrisos (poesia surrealista)
.  Ao meu melhor amigo, eternamente
.  Vai lá socar um título epiléptico, vai

Meus três primeiros contos foram feitos em redações de vestibulares. O deste post é da UEG de 2013. Se tiverem interesse de ler os enunciados das redações, abram o spoiler, se não, apenas leiam os contos diretamente.

Spoiler:

Uma Humana

Estava sentada na cadeira em frente a uma grande mesa cheia de papéis e livros referentes aos seus estudos para passar no vestibular, enquanto recordava alguns meses atrás, quando era livre para pegar o material que quisesse, sentar-se no sofá ou na cama e estudar sem pressão. Naquela época ainda podia assistir à televisão, caso ficasse exausta dos estudos.

No entanto, sua realidade atual era demasiadamente diferente. Quando o fim do ano se aproximou, a mãe da jovem impacientou-se. O momento que definiria o futuro da filha batia à porta, mas a menina não parecia se importar. Então a mãe tomou as providências por ela: seria o mais rígida possível; megéra, se fosse necessário.

Acabou impondo à filha uma rotina inumana. Com muita dificuldade, a menina adequou-se àquilo, mas funcionara extraordinariamente bem. Em um curto espaço de tempo, ela aprendeu muito mais do que havia aprendido no resto de sua vida.

Porém, enquanto estudava para a primeira prova, que seria no dia seguinte, estava ansiosíssima. A mãe ameaçara-a com castigos e a condenaria a continuar vivendo daquela forma se não fosse aprovada.

No outro dia, tremia compulsivamente durante a prova. Lia e relia cada questão inúmeras vezes, mas a compreensão lhe escapava. Na mente da jovem, o temor de encarar a mãe sem corresponder às duas exigências a entorpecia. O sinal do recolhimento da prova tocou, soando alto em seus ouvidos. A menina chorava em silêncio, desolada e atemorizada. Seu gabarito estava em branco.

Ao retornar à sua casa, com os olhos fundos e vermelhos, somente uma frase escapava de seus lábios, em murmúrio: “Me perdoe, mãe”. Quando se deparou com a situação da filha, a compreensão da mãe veio de súbito, como um soco. Pensara ter feito certo ao impor tamanho medo e rigidez à filha, mas enganou-se.

Chorando, se aproximou lentamente da filha e abraçou-a. Estava tudo bem, ainda haveriam outras chances. Sua filha não precisaria ser tratada como uma máquina receptora de ordens. Iria estudar e teria a ajuda necessária da mãe, mas o faria sem ser privada de seus desejos, como um ser humano.

↭ ↭ ↭


Pronto! Façam a avaliação de vocês: quanto acham que eu mereço de 0 a 70? Na cópia da redação, eu coloquei os erros também, que felizmente foi apenas o acento agudo em megéra, que não existe, e o haviam, que devia ser "havia" (o pior é que eu sei essa regra do verbo haver, desespero do momento que me atrapalhou). Quanto a minha resposta à proposta, eu achei adequada. Não precisei estudar como um burro de carga para passar na 1ª fase, e espero passar na 2ª para provar isso com mais contundência! haha


Última edição por Schai Blich em Dom 10 Nov 2013 - 21:30, editado 14 vez(es)

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Mensagem por Diamandis Sáb 1 Dez 2012 - 11:12

Olha, a ideia central do conto é muito boa, mas o desenvolvimento a partir do terceiro parágrafo ficou meio blergh, não é que tenha ficado ruim, mas pelo que você apresentou nos parágrafos anteriores eu esperava um desfecho melhor.

De 0 a 70 = 60


Boa sorte com suas provas e continue escrevendo textos e pontando aqui. ^^

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Mensagem por Mag Sáb 1 Dez 2012 - 18:32

Muito obrigado pela avaliação, Bragato! Outras pessoas avaliaram para mim e acredito que a média da minha nota seja entre 65~60. Espero que seja mesmo, porque acho que seria suficiente para passar no vestibular... Quanto à critica, eu admito ter tido uma ideia melhor para o desenvolvimento do conto, mas não consigo imaginar outro desfecho. De qualquer forma, muito obrigado mesmo!

Aproveitarei o comentário para postar outra redação narrativa que fiz segundo parâmetros do mesmo vestibular, mas de um ano anterior. Escrevi-a a fim de me preparar para o dia definitivo. Como eu só queria uma avaliação com nota da outra redação, não vou colocar o enunciado desta; fiquem com o conto cru:

Reações

O colégio estava uma baderna. O intervalo recreativo havia iniciado e todos os alunos aproveitavam o momento de descanso. Exceto um deles. Um menino bonito, caso ignorassem os óculos – o que não ocorria. Ele era um nerd, tipicamente o garoto inteligente e retraído que esse tipo estereotipado tende a ser. Mas essa não era sua personalidade, era o que a sociedade imputou a ele por demonstrar interesse e facilidade na aprendizagem. Se o tivéssemos conhecido antes de ter a vida que teve, encontraríamos uma pessoa não apenas intelectualmente superior, mas também simpático, sorridente, afável e divertido.

Agora, no final do ensino médio, o garoto era perturbadoramente depressivo. No entanto, neste dia específico ele estava ainda mais indisposto. Recolheu-se num canto da escola durante o intervalo e esperou que não tivesse sua solidão interrompida. Sua querida mãe falecera naquele mesmo dia do ano anterior. A lembrança da perda e a saudade que ele sentia traziam à tona sentimentos devastadores.

Mas os outros alunos, populares e desinteressados, queriam fazer a escola rir, e isso envolvia humilhar o garoto nerd novamente. “Uma última vez”, diziam. Estava decidido: eles o confrontariam com insultos à sua aparência desajeitada e à morte da mãe, caso necessário.

E o fizeram. Contudo, ninguém esperava a reação do garoto. Sempre acomodado com a humilhação que recebia, acabou impacientando-se e revidou. Com palavras inteligentes, apontou o ponto mais frágil de cada estrutura humana que o atormentava. Enfim, a pancadaria principiou-se. O garoto nerd foi socado na face e reagiu com o mesmo ataque, mas estava em desvantagem. Acabou no chão, sendo surrado por três ao mesmo tempo.

A coordenação do colégio deu fim à baderna e penalizou todos os envolvidos com advertências e suspensões. Mas não fora o suficiente para impedir que um dos jovens, revoltados com a reação do nerd que devia sofrer inerte, levasse uma arma à escola e assassinasse um futuro gênio da literatura.
Sim, neste caso fui um narrador excepcionalmente onisciente.

O que acharam?


Última edição por MaGmorTar em Qui 10 Jan 2013 - 4:05, editado 1 vez(es)

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Mensagem por Diamandis Sáb 1 Dez 2012 - 18:58

Cara, muito bom e muito desesperador, hmm.. me pareceu um pouco as crônicas do autor de "O Cortiço" (agora me fugiu o nome).

Enfim, não esperava esse desfecho, esse realmente surpreendeu, me lembrou um pouco de Machado de Assis.."Se as coisas estão ruins, elas podem piorar".

Enfim, foi uma narrativa muito boa, continue com seus textos, por favor.

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Mensagem por Pokaabu Seg 10 Dez 2012 - 21:07

Cara, adorei esse último conto, o final mostrando a morte do garoto... Quando você for começar a escrever uma fan fic não esqueça de me avisar!

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Em breve.
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Mensagem por Bakujirou Qui 13 Dez 2012 - 2:28

Oes man, resolvi vir assim que tive oportunidade pra ler os contos. O primeiro, bom, é um conto bem intrigante, foi tocante a parte final. Acho que poderia ganhar um 65, com honras. O outro texto que descreveu também ficou bem bacana, curti o seu one-shot.

/mmmm Boa sorte ai man, nas suas novas produções!

Diamandis: Trancado por inatividade, caso queira reabrir, contate um ffm.

Diamandis: Destrancado a pedido do autor, boa sorte.

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Confira:
Concurso participem! / Fic / One-Shots / indico uma fic que resgatei / indico Fic de meu amigo

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Mensagem por Mag Seg 4 Fev 2013 - 23:50

Ei, pessoas legais. Muito obrigado pelo comentário Bragato, Pokaabu e o Sir. Baku.
Pok, a questão das fics você viu por si mesmo. hehe
Bragato, você quase acertou minha nota, mas o Baku foi certeiro! O ponto exato. Vejam o espelho da avaliação da minha redação:

Spoiler:

De qualquer forma, ontem e hoje fiz mais vestibular, desta vez da UFG, e hoje teve a redação. Dentre as três opções de modalidades de redação, havia o Conto de ficção científica. O tema é intitulado como "A busca pela juventude eterna: solução ou agravamento do conflito entre gerações?".

Quem tiver interesse em ler o enunciado da redação, é só abrir o spoiler abaixo. Se não, leia direto a redação. Não há necessidade alguma de ver o enunciado.

Spoiler:

A vida como ela é
- Então você pretendia mesmo encontrar a fórmula do rejuvenescimento? – perguntou o policial, zombeteiro.

- Não, - respondi, peremptório – era para eternizar a juventude.

Assim como ele fizera, eu seria rotulado pela mídia como um cientista louco, atormentado pela nostalgia da juventude ou por filmes de ficção científica. Mas não o sou. Sou apenas mais um velho que assistiu à morte de muitos amigos em estados vergonhosos, humilhantes. Não suportava mais olhar ao meu redor e saber que tudo continuaria assim, que outras inúmeras gerações viriam a passar pelo mesmo que eu.

Então tomei uma decisão. Sabia que era física e biologicamente impossível tornar alguém idoso de volta à juventude. Mas acreditava ser capaz de descobrir algo que pudesse, em última hipótese, ao menos prolongar a juventude. Sabia que havia produtos que tentavam esconder as marcas da velhice, mas eu queria algo muito maior. Queria conseguir manter um mesmo caráter físico e psicológico das pessoas por muito tempo, diminuindo a mutabilidade impregnada ao ser humano.

Fiz incontáveis pesquisas e encontrei coisas peculiares, que se estudadas com abrangência poderiam assemelhar-se ao que eu queria. Mas o mais importante me escapava: as cobaias. Esse termo trouxe-me à mente imagens indesejadas, mas eu era um biólogo conceituado, tudo estava sob controle. Optei pelas pessoas mais próximas à mim; meus dois netos aceitaram e até conseguiram alguns amigos também, que sob pressão e com o conhecimento de meu conceito, hesitaram pouco em discordar.

Eu ainda tentava atribuir-lhes a culpa de tudo o que viera a acontecer, por serem tão facilmente influenciados, mas no fundo sabia que a culpa era minha. Dos vários resultados que obtive, fui fazendo com que, pouco a pouco, todos eles experimentassem. Os testes não duraram nem um mês.

Meus netos começaram a me questionar de dores e de sensações estranhas, inapropriadas. Logo depois, um de seus amigos teve de ser hospitalizado e, inevitavelmente, morreu. Foi um susto muito grande, pois sabia ser eu o causador daquilo, apesar de me iludir afirmando ser outra coisa qualquer. Só fui realmente descoberto depois de meu neto morrer e minha neta ser internada.

- Vô, - disse-me, deitada na maca – eu não o perdoarei pelo que fez. Mas que lhe sirva para compreender que o envelhecimento é parte integrante da vida. Se conforme com isso, como fizeram tantos outros, e vá viver. – Foi a última coisa que disse.

Refleti no que ela dissera e achei que tinha razão. Teria de me conformar com o processo de envelhecimento, amadurecimento e morrer como um velho decrépto.

Peguei prisão perpétua, mas não é tão difícil lutar contra a lei como é com a velhice.
Qualquer semelhança com Nelson Rodriguez é, sim, mera coincidência. Só digo que foi o único título que me veio à mente. Espero que os avaliadores não vacalhem.
Quanto aos erros, desta vez foi só um, o lindo decrépto sem i. Eu tentei colocá-lo no texto em outros lugares, mas sabia que tinha algo errado. Mas no fim, faltando 5 minutos para o término da prova e 4 parágrafos para passar à limpo, com a mão dura e rígida de tanto escrever, minha única alternativa foi copiar tudo da maneira que estava e com um garrancho que me descontará nota, com certeza.

Só espero que em meu próximo vestibular, eles tenham um aparelho eletrônico para que façamos a redação. Até quando terei que ficar com a mão dura, riscando palavras, espremendo-as no texto e passando vergonha com minha letra tipo médico super sayajin?

Ah! Qual nota eu mereço entre 0 e 40?

E visitem minha fanfic: A Irrealidade da Vida.

Beijões.


Black: Tópico trancado por inatividade. Caso queira reabri-lo mande uma MP a qualquer Fanfic Moderador.

Black: Destrancada a pedido do autor.


Última edição por Mag em Dom 7 Abr 2013 - 23:14, editado 3 vez(es)

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Mensagem por Mag Dom 7 Abr 2013 - 22:43

Povo ignorante, um mês sem comentar. E logo no conto que está tendo mais visualizações no meu blog, que é o "A vida como ela é". Tudo bem, também amo vocês.

Aos novos leitores, eu suplico que ignorem todos aqueles enunciados das redações e leiam somente os contos. Acho até que vou apagar aquilo pra não encher linguiça.

Agora vou postar um conto aqui que eu usei no concurso inspirade imagens aqui do fórum, mas serve pra quem não participou. Lá vai:

A página Quaissquer? Cropped-there-is-always-hope-2516881

Ab imo corde*

Tons incolores de cinza. A inexistência da coloração divergia da derradeira cor, a mais pungente delas. Delineando-se desde o seu princípio por uma base insolúvel, crescendo em desalinho até o ápice intragável. O cume era a cor que descolorava. Aquela que se mantinha imponente, subjugando aos seus cúmplices um emaranhado indizível de compreensões e emoções.

A menina... A menina prendia-se a paisagem num fiapo de real cor. Assistia-a entorpecido, enquanto seu coração, de um vermelho escarlate, pulsava e causava o efeito descolorante no cenário ao redor. Nada se comparava àquela cor.

***

Com os últimos centavos que ganhara balançando ritmicamente em seu bolso, a menina caminhava pela rua de paralelepípedos, devaneando sobre a vã filosofia, que hora propunha-se a duvidar, hora afirmava sem hesitar.

A menina, ainda muito nova, dedicou-se sumariamente aos estudos da filosofia, sociologia, antropologia e literatura. Não que ela tivesse real intenção em se considerar a diferente em meio às outras pessoas da sua idade. Mas sair para brincar na rua, divertir-se com amigos e interagir com os outros de forma geral, invariavelmente nos leva a ter parte de nossos segredos revelados, mesmo que involuntariamente, segundo seu pai. E ela não queria isso. Fechou-se para a vida, voltou-se para os estudos.

Mas não com tanta eficácia”, pensava a menina enquanto continuava a fazer sua trajetória. Na escola, costumava excluir-se de grupinhos e observar os outros com atenção. Foi dessa forma que se deparou com outra menina que fazia exatamente o mesmo que ela. Tímida e quieta, evitava o contato com os outros e os observava, faminta por vivacidade. Trocaram olhares, mas não se assustaram de imediato. Só quando perscrutaram os olhos uma da outra foi que um súbito de compreensão tocou-as, irreverente.

Eram iguais. E souberam, naquele instante, a característica que as igualava. Não era a aparência, nem o que toca no quesito personalidade, mas outra coisa. A reação de reconhecimento fora inteiramente incomum, perceberam, mas contundente e irrevogável. No entanto, nunca tiveram coragem de conversar. Aquele olhar fora o único contato que tiveram.

Mas agora a menina decidira. Caminhava em direção a escola e estava preparada para conversar com a outra. Com certeza, ela também se sentiria confortável com alguém igual. Afinal, aquilo as uniria. Quem pensaria que algo como aquilo provocaria alguma união agradável?

Chegou a sala, sentou-se em seu lugar e sorriu para a outra. O sorriso assustou a si própria. Há tempos não esboçava um sorriso em sua face. Parecia estar errado, desconcertado em seu rosto. Desaprendera a sorrir? Pensou que sim, mas não teve certeza.

No intervalo escolar, já havia decorado para onde a outra ia. Era sempre o mesmo lugar, propício para isolar-se. Correu à calçada da escola, onde o moço que vendia balões a gás hélio ficava, e gastou o resto do dinheiro que tinha comprando um balão. Escolheu um que tinha o formato de um coração, com delineação delicada, e era de um lindo vermelho. Considerou-o um bom presente.

Retornou para a escola e foi ao lugar em que a outra estava. Ficou temerosa, mas seguiu em frente. Já havia começado, que terminasse agora. Enquanto aproximava-se devagar, viu algo escrito numa das paredes desbotadas da escola, próximo ao lugar em que a outra estava. “There is always hope”. Num átimo de compreensões, tudo interligou-se em sua mente. O coração acelerou-se com a ansiedade e ela começou a tremer. Mas estava confiante; nunca se sentira assim. Até mensagens em inglês escritas anonimamente nas paredes pareciam confabular para o seu bem.

Chegou ao seu alvo. A outra encontrava-se sentada no chão, encostada à parede da escola, comendo o seu lanche. Quando a sombra da menina projetou-se sobre ela, a outra olhou para cima e sentiu-se extasiada.

– Oi – disse a menina, com delicadeza.

Sorriu novamente e pareceu mais confortável. Achou que se continuasse a praticar, logo poderia fazer como as crianças que gargalhavam estridentemente.

A outra menina continuou fitando-a, indecisa.

– Não quer caminhar comigo? – Prosseguiu, com o sorriso que perdurava em seu rosto.

Olharam-se com mais intensidade. A menina estendeu a mão que segurava o lindo balão, oferecendo-o para a outra. Pareceu uma oferta cobiçável, a outra hesitou por alguns segundos e sua face expressou o desejo que sentia de levantar-se e conversar.

O desejo incontido, no entanto, não demorou a ser domado. Ela sabia no que isso daria. Seria errado e causaria prejuízos para as duas. Não, doeria, mas faria o correto. Levantou e fitou, pela última vez, os olhos da menina que pareceu o seu reflexo. Balançou a cabeça, negando o contato.

Para a menina, aquele movimento pareceu um sonoro “não”. Ficou estática, enquanto a outra saía da sua frente lentamente. Vultos irreconhecíveis passaram por sua mente, lembranças do seu pai fazendo as atrocidades com ela e o momento em que, num súbito de coragem, contara tudo para sua mãe, que depois de inicialmente desesperada, tornou-se enraivecida e mandara que a menina nunca mais voltasse a falar daquilo. A imaginação do que deveria acontecer com a outra também a invadiu, mas a curiosidade já se fora. Antes, pensara que aquele contato poderia ser sua salvação. Pensara que, de alguma forma, se as duas se tornassem amigas, poderiam ter uma ideia do que fazer.

Então lembrou-se da frase na parede e a achou ridícula. Devia ter sido uma pessoa iludida por uma utopia momentânea que a escrevera. Imbecil, imbecil. Qual a esperança? Talvez fosse a de encontrar alguém com quem partilhar sua dor, e nesse instante esperar que ela corresponda às suas expectativas. Mentira. Nunca corresponde. E nisso há reciprocidade. Você também não corresponde ao que o outro espera.

Sentiu tanto ódio da criatura que escrevera a frase, que deixou escapar uma lágrima por seus olhos. Fora traída e enganada. Quando pensou que sua raiva não poderia mais aumentar, outra possibilidade passou por sua mente. Talvez a pessoa que escrevera a frase tivesse esquecido que a sentença deveria ser interrogativa, e não afirmativa. “Is there always hope?”. Esse é o tipo de regra que geralmente as pessoas esquecem. E o ponto de interrogação perdeu-se na parede com o tempo. Não faz mal, pois a menina perdoou, do fundo do seu coração, a falha da criatura vândala.

Olhou para o céu nebuloso, que predizia uma chuva gélida. Uma radiação iridescente de luz solar ultrapassou as nuvens e refletiu, frágil, na face da menina, secando a única lágrima que escorreu. Levantou a mão e soltou o balão. Enquanto subia os seus primeiros centímetros no ar, em liberdade, a menina teve um vislumbre de si mesma. Estava tudo cinza, exceto o balão escarlate que a desamparou.


*Ab imo corde: do latim, "Do fundo do coração; sinceramente.", segundo o site Dicionário de Latim.

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Mensagem por Caio. Dom 7 Abr 2013 - 23:28

Lembro desse teu texto no concurso de OS... Realmente, ele ficou muito lindo e eu adorei o título em latim. Você era para ter ganho aquele concurso... Ou talvez o Gui, vá saber, né?

Sei apenas que você passou muito bem a idéia na imagem... Mentira, você abstraiu uma ótima idéia da imagem... Acho que isso descreve melhor esse conto.

Bem, that's it.
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Mensagem por Yoshihime Seg 8 Abr 2013 - 1:25

Vou comentar só sobre "A vida como ela é", porque o outro já comentei no concurso e no blog.


Achei o texto bem humano, pela sensação de culpa e arrependimento do narrador. Além de tratar com um medo muito comum, o de envelhecer.
"Peguei prisão perpétua, mas não é tão difícil lutar contra a lei como é com a velhice."
Essa passagem foi perfeita para a conclusão do texto. Daria 35 de 40.

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Mensagem por Diamandis Qui 11 Abr 2013 - 15:32

Caramba, Mag, você só melhorou, conto lindíssimo, o sentimento angustiante de envelhecer.

Cara, sem palavras para esse segundo conto, amei mesmo a história, você está escrevendo super bem.

Nota 10!

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Mensagem por Mag Sex 12 Abr 2013 - 23:52

Sabia que postar esses contos passados aqui teria utilidade!
Resposta aos coments:

Spoiler:

Agora tem uma coisa que está me importunando sobre aquele "Ab imo corde". Eu não joguei diretamente na cara do leitor, mas eu pretendia que fosse compreensível o fato de que a personagem era estuprada pelo pai. Vocês entenderam isso ou nem passou pela cabeça? Quando escrevi, pensei que todos diriam "Caraca, a menininha era estuprada", mas ninguém disse, então estranhei...

Vou postar o último conto que escrevi, que também foi para um concurso de One Shotiiiis aqui do fórum. Mas não fiquem tristes, queridos, eu já estou com a ideia pra escrever outro, que será bem diferente desses meus contos usuais. Leiam e espero que gostem:



O Grito

Quando o sol centralizou-se no céu foi que Marlon sentiu sede. Medo também. Já fazia uma hora que parara naquele lugar abruptamente. A terra era árida e seca, cheia de rachaduras que se arrastavam pelo chão, sem fim aparente. O calor do sol escaldante torturava seu corpo. Não havia sequer um resquício de nuvens naquele céu que parecia querer cegá-lo.

Ao longe, esparsamente espalhadas, havia umas poucas árvores de galhos retorcidos, cascas ressequidas e folhas escassas; sob seus pés descalços, um mato rasteiro e seco mantinha-se firme à terra, embora tivesse uma aparência sem vida, de sequidão mórbida. Embaixo de uma das árvores, viu duas girafas tranquilas tentando alcançar as folhas, e aproveitando da pouca sombra também, percebeu.

Continuou andando para o que achou que fosse o norte. Em algum momento durante a caminhada, viu vários elefantes afastando-se para o leste. Pensou em segui-los. Provavelmente encontraria água. Mas poderia se perder... A ideia pareceu-lhe ridícula. Já estava completamente perdido; poderia se arriscar a ir aonde quisesse.

Seguiu-os, mas à distante. Então ponderou. Ele estava na África? As características que via eram fortíssimas, mas como? Como fora parar ali repentinamente?

Não andou muito até que ouvisse berros de medo e dor. Não era um som produzido por animais. Eram seres humanos. Perscrutou todos os lados, tentando visualizar mesmo com o mormaço que subia da terra e embaçava a visão. Muito longe, à direita, viu o que poderiam ser cabanas.

Com esperanças atulhando em seu coração, correu naquela direção. Precisava alcança-los e tentar compreender o que havia acontecido. Quanto mais corria, mais percebia o quanto já estava exausto e sedento.

No meio do mato seco, deitado na terra, avistou um grande leão. A cabeça estava virada em sua direção. Freou subitamente, soltando um grito de desespero. Mas o animal selvagem não moveu um músculo sequer. Parecia não tê-lo visto, embora estivesse com os olhos em cima dele. Decidiu que não ficaria ali nem mais um segundo. Prosseguiu correndo, voltando a cabeça para trás para verificar se o leão o perseguia. Nada.

Ao chegar bem próximo das cabanas, Marlon ouviu mais gritos aterradores. Eram humanos, sim. Mas havia alguma coisa errada. Continuou, mas desta vez devagar. Não queria ser surpreendido numa chacina de leões.

Chegou ao lugar. No chão, espalhados para todos os lados sem qualquer cuidado, estavam corpos de homens e mulheres negras deitados, mortos. Tentou acalmar a respiração acelerada pela falta de fôlego. Novo grito propagou-se, agora mais alto. Vinha de trás da cabana logo a sua frente. Marlon foi até lá, devagar.

A cena fora a mais intrigante de sua vida. Sentado no chão estava uma criança em prantos. Era negro como o carvão, o cabelo crespo. Seu corpo era magérrimo. As lágrimas desciam de seus olhos e traçavam uma cova de dor na face suja de terra do menino. A pele transparecia, no entanto, a maior resistência que ele já vira. E nisso, sua pele era contraída sem controle contra o próprio corpo.

Na frente do garoto, uma mulher tão negra quanto ele estava ajoelhada no chão. Chorava. Em pé, diante dela, havia um homem branco, com olhos inundados de escárnio, que sorria para a situação. No início e para sempre, o que mais atormentou Marlon fora a forma destoante em que as peles do homem e da mulher se comparavam. Branco e preto. Preto e branco.

O homem levantou a mão, e nela um chicote de couro foi brandido contra a mulher. Um urro de dor esvaiu-se por sua boca. Cuspiu sangue involuntariamente. Mas manteve-se firme, na tentativa de proteger seu filho. A mão branca levantou-se novamente e o movimento fora perfeito. O chicote de couro envolveu o pescoço da mulher, que soltou um berro de sofreguidão tão alto que doeu o tímpano de Marlon, o espectador.

A mulher começou a ofegar, afoita, com ira e ódio. Segurou o chicote com as duas mãos e tentou puxa-lo e empurra-lo com toda a força que lhe sobrara. Mas não fora suficiente. Continuou bufando, cuspindo e tentando inspirar e expirar o ar. Morreu pouco tempo depois, sem poder despedir-se de seu filho.

A mão branca desenrolou o chicote do pescoço da mulher, mostrando três seguimentos de marcas deixadas ali para sempre. A criatura de pele branca olhou para o garoto negro que ainda berrava e chorava.

Ao espectador, aquele fora o clímax. A criança respirava com força, e a cada movimento de seu corpo, sua pele contraída parecia ser pressionada contra as próprias costelas por algum poder infame. Aquela dança continuou em câmera lenta, onde a costela tentava, infrutiferamente, rasgar a pele resistente do garoto, que sempre voltava a se estufar. A atenção de Marlon só se distraíra pelo movimento da criatura branca ao lado.

A mão estava levantada no ar novamente, pronta para mais um ataque. O espectador não compreendia o que estava acontecendo. Mas ele avançou. Num urro de raiva, pulou em cima da criatura branca. No mesmo instante o chicote desceu em sua velocidade máxima. Marlon atravessou o chicote e o homem e caiu no chão, estatelado. Um som agudo irreconhecível vazou pela boca de alguém, mas o espectador não quis pensar em quem fora. Tentou virar a cabeça para olhar, mas já não havia mais nada lá.

Estava na sua cama, em seu quarto, suando por todos os poros de seu corpo e remexendo-se sem controle. A respiração saía e entrava por suas narinas com dificuldade, e o som do ar se movendo para fora e para dentro era desesperador. Abriu os olhos. Estava tudo escuro. Empurrou a coberta fina com seus pés e, tremendo em compulsão, colocou sua mão na frente de seus olhos.

A mão era pálida. Branca e pálida. Pálida e branca.

Gritou.


Última edição por Mag em Sex 17 maio 2013 - 1:38, editado 1 vez(es)
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Mensagem por Caio. Dom 14 Abr 2013 - 11:56

Juro que no texto anterior não saquei a parada do estupro =/ Até reli esse (já que já tinha o visto) para tentar sacar melhor. Bem, não preciso dizer que você me deixa macambúzio com sua escrita, não é? Sério, você escreve as coisas muito bem, conquanto mal tenha começado letras. Sua narração, outrossim faz-se fantástica. Não sei usar outrossim. É tão bizarro q

Ok, estava brincando com palavras difíceis. Como disse no concurso, adoro contos que se passam na África. O que me chamou bastante atenção foi você ter dado extrema ênfase no constraste de peles, o negro e o branco. Reparei que esse episódio parecia se passar na época da escravatura, embora não tenha dado muitos detalhes. Ou seja apenas uma chacina l0k4, afinal, o cara matou geral Laughing

O final que me deixou na dúvida. Mão branca? Branca e pálida? Pálida e branca? Seria ele um fantasma? Teria ele sido um dos passivos sofredores da chacina que morrera? Não sei... Mas ficou bom Smile

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Mensagem por Mag Ter 7 maio 2013 - 0:27

Resposta ao especial do Perry:
Spoiler:

Vou postar agora o conto que usei no último round do concurso de one shots pra quem não teve a oportunidade de comentar lá. É bem diferente dos maus usuais e diria que foi extremamente influenciado por minha última leitura concluída: "Assassinatos na Rua Morgue e Outros Contos", do genial Edgar Allan Poe.


Assalto
A mulher me olhou e gritou esganiçada. Corri e tapei a boca dela com a mão. Em meu ouvido, o velho gongo soou baixinho. Eu não podia ter medo nem compaixão; precisava ter convicção para ameaçar. Se eles não fossem imbecis, tudo correria bem. Mas se fossem...

É bem provável que ela tenha gritado por causa da arma que estava em minha mão. Uma bela e potente arma, eu diria. Talvez eu fosse um idiota por aparecer assim abruptamente, mas quem me culparia? Este era apenas o meu primeiro assalto.

Tirei a fita adesiva e a corda da mochila em minhas costas, calei a boca da mulher e amarrei os pulsos e tornozelos dela. Enquanto se debatia no chão, desesperada, lançando em mim olhares pedintes, lágrimas escorreram por seu rosto. Essa imagem me trouxe à lembrança as vezes em que minha mãe teve convulsões antes do AVC que a levou para a eternidade. E isso me deixou com raiva, odeio me lembrar da morte da minha querida mamãe.

Nas escadas, ouvi o som atrapalhado de passos. Devia ser uma pessoa esperta, porque não fez escândalo, vinha sorrateiramente para saber o que estava acontecendo. Por pouco não fui pego desprevenido. Antes que aparecesse, deixei a mulher estirada no chão e corri ao canto da sala onde não podia ser avistado de imediato.

A mulher gemeu mais alto. Tinha percebido que alguém estava vindo, mas não pôde fazer nada. O som de passos lentos na escada parou por um segundo para ser substituído logo depois por passadas rápidas e apressadas. Um homem grisalho, mas não idoso, desceu os últimos degraus e correu até a mulher. Minha arma estava apontada para ele:

- Mãos ao alto e se afaste dela! – Disse, convicto.

O homem não correspondeu, o êxtase de ver a mulher – que provavelmente era sua parenta – daquele jeito fez com que ele não percebesse mais nada ao seu redor. Então ele começou a desamarrar a mulher, que com os olhos esbugalhados, tentava dizer algo ao outro.

- Para! Não desamarre ela!

Mas ele continuou a desamarrar, com os braços que tremiam atrapalhando-o no ato, sem mostrar nenhuma reação ao que eu disse. Nem mesmo ousou levantar o olhar em minha direção. O velho gongo soou em minha mente, desta vez um pouco mais forte. Não consegui suportar. Apertei o gatilho e um som mudo invadiu a sala, estilhaçando o cenário de murmúrios e gemidos do casal.

O buraco que se formou na testa do homem pareceu fatal. Mas obviamente era. Ele havia caído no chão poucos segundos depois, o sangue jorrando aos montes por aquele orifício tão pequeno, sujando de um belo vermelho o tapete da sala bem ornamentada. A mulher se imobilizou instantaneamente com a queda do outro, e por um minuto tudo permaneceu num silêncio que me atormentou profundamente.

Um som indefinível trespassou o adesivo que tampava a boca da mulher. Era agudo e dilacerava a alma. As lágrimas que desceram dos olhos brilhantes e encharcados dela explicitavam uma tristeza escabrosa. Eu quis voltar no tempo, leitor, mas já não podia. O único jeito foi continuar mesmo...

Com passadas rápidas e longas, avancei até a mulher que estava sentada de um modo desajeitado, observando o homem que teimava em continuar gorgolejando sangue no chão. Toquei em seus ombros delicadamente, mas ela soltou um chiado tão melancólico de medo, mais por meio do nariz que pela boca, que eu fiquei estático. Escorreria catarro das narinas dela. Ela se jogou no piso e começou a se remexer para todos os lados, numa tentativa alucinada e infrutífera de se afastar de mim.

Balancei a cabeça negativamente, com o rancor aumentando em meu coração. Aquela criatura sórdida devia pedir para que eu a matasse ao invés de tentar fugir e manter a vida longe do homem pelo qual chorava tão desesperadamente. Aquilo era só uma farsa para me emocionar, ela não devia sentir nada por ele.

Peguei com brusquidão os cabelos dela e a puxei escada acima sem prestar atenção às lamurias de dor e medo que ela tentava soltar, mas que falhava por causa da bendita fita. Eu tinha que me lembrar de agradecer ao chefe pela sugestão tão eficiente de usar aquele adesivo.

No topo, fui até a porta entreaberta do corredor, entrei e tranquei-a por dentro. Era um escritório. A mulher ainda chorava, mas desistira de gritar. Apenas fungava com força, tentando buscar fôlego. Coloquei um dedo em meus lábios e falei:

- Agora você vai ficar calada e só responder o que eu preciso. Juro que não vou te fazer mal. – Menti, mas este é um daqueles famosos casos em que a verdade é inoportuna.

Agachei ao seu lado e arranquei o adesivo que tampava sua boca. Ela queixou-se da dor, mas sem gritar. Ofegou um pouco e me fitou com aqueles olhos suplicantes, cheios de água. Será que ela estava mesmo triste?

- Eu só quero saber onde está o maldito cofre. Só isso.

Ela me observou com atenção, mas o que eu disse pareceu fazer com que ela chegasse, lá no fundo de sua mente, a uma conclusão do que aconteceria no final de tudo. Seus olhos sempre brilhosos derramavam lágrimas outra vez. Ela começou a soluçar baixo enquanto chorava copiosamente. Meus olhos também se encheram de água involuntariamente.

- Só me diga onde está o cofre. – As lágrimas escoriam por meu rosto enquanto eu me aproximava vagarosamente da mulher imóvel. – Onde?

Sem respostas. Apenas choro. O gongo soa em minha mente outra vez, agora alto demais. Isso já estava me enjoando. Tirei a faca da mochila e encostei-a brutalmente no pescoço da mulher, que voltou a ofegar com medo, mas o desespero anterior havia sumido.

- Vai dizer onde está a merda do cofre ou não? – Cuspi.

Ela abriu a boca, mas apenas um grito saiu de lá. Recoloquei rapidamente o adesivo e estapeei a cara dela, que voltou a ficar quieta. Ela não me contaria nada. Como era idiota... E seus olhos brilhavam de tal forma... me hipnotizavam. Enfiei a faca no seu olho direito, afundei e girei. Ela urrou e se sacudiu, esperneando de tal forma e com tal brusquidão e descontrole, que temi ter matado logo no primeiro ataque. Arranquei a faca de seu olho, mas ela continuou a rolar pelo chão, chiando um emaranhado de sons incompreensíveis. O que ela sentia era só dor, o espaço para sentir falta do outro já não existia...

Eu a assistia também chorando sua situação, mas ela não se acalmava. Comecei a ficar impaciente... O gongo, sempre o gongo. Zumbiu em meu ouvido tão alto que na hora pensei ter sofrido uma lesão nos tímpanos. Coloquei as palmas da mão tampando os ouvidos, esperando a dor parar. Depois agachei ao lado da mulher, segurei-a pelo pescoço e fitei com intensidade odiosa sua face. As lágrimas se transfiguraram, agora eram de sangue escarlate. Sangue infindável. A visão deles não me acalmava.

Vi no olho intacto da mulher um misto dúbio de tantos sentimentos, que hoje chego a cogitar que ela me amou – mais do que o próprio homem que eu havia matado em sua frente. Há sempre aquele sentimento de compaixão para com o vilão dos enredos ficcionais, não é?

Dilacerei a goela da mulher com a faca. Sangue e mais sangue espirou para todo lado, mas ao menos ela ficou quieta. Enfim, estava em paz. E o melhor: com o outro homem que ela amava. Me senti calmo e até com um resquício de felicidade com essa notícia. Eu nunca poderia ter correspondido ao amor que ela sentiu por mim.

O resto daquele dia tão cheio de brilhos e sons eu gastei à procura do cofre, mas só encontrava documentos espalhados pela casa. Eu era analfabeto, nunca soube o que estava escrito neles. Antes do sol se pôr, coloquei uma roupa limpa, guardei todos os documentos e evidências em minha mochila e saí da casa pela porta da frente, tranquilo.
***
Um jovem alto e forte, de no máximo 25 anos, trajando roupa preta e carregando uma mochila da mesma cor nas costas trancava a porta da casa. Um estudante indo para a faculdade ou visitar um amigo. Quem sabe?

Deixou a chave pendurada na fechadura. Virou-se, respirou fundo, restabelecendo ao seu rosto uma coloração forte e vivaz. Sorriu. Parecia estar feliz. Depois começou a andar, chegou a rua e caminhou calmamente pela calçada.

Fixada na porta da casa havia uma bela placa negra onde se lia em letras brancas:

Aqui vive uma família
surda, mas feliz.

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Mensagem por Yoshihime Ter 7 maio 2013 - 9:56

Só fui conseguir tempo para ler esse conto agora, e adorei. Ele é forte, mostra o despreparo, desconhecimento, e infantilidade do ladrão, começando no que tange suas próprias falas, que são infantis em vez de ameaçadoras, como em "- Para! Não desamarre ela!" é uma fala boba no contexto em que ela está demonstrando toda falta de experiência do assaltante, a única coisa que tornaria qualquer fala dele ameaçadora é a presença da arma. O desconhecimento é obvio, ficou demais o final do conto, mostrando uma explicação para vários dos acontecimentos. As descrições foram fortes, viscerais e precisas, transmitindo de maneira fantástica as cenas. A única coisa que eu não gostei, na verdade detestei, foi o pensamento dele sobre a possibilidade da mulher ter amado ele, que tipo de estocolmo instantâneo foi esse? Sei que ficou na mente do rapa, mas por que diabos ele pensaria algo assim? Só mesmo se pautado na loucura;

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